Artigo: A Espada de Aventurina

Criada nas regiões centrais de Odenheim no século VII, esta é uma das armas mais versáteis e equilibradas que já vi, apesar de nunca ter conhecido sequer um espadachim que a dominasse completamente. Quando a demanda por carvão cresceu na capital e as florestas odenianas começaram a ser desmatadas para fornecer lenha, Maeve respondeu com um ataque cruel de conjurações que durou para muitos anos além do arrependimento dos odenianos. Mesmo depois das árvores restituídas, felpi e outras conjurações em bandos terríveis assolavam as noites em vilas pequenas, e os cavaleiros da capital não podiam estar em todos os lugares ao mesmo tempo.

Muitas armas foram tiradas de seus baús naquela época. Muitas ainda conservavam o vigor, seus metais ainda reluziam. Muitas estavam inúteis, quebradas, repletas de ferrugem, prontas para serem quebradas com uma só agadanhada terrível dos felpi. Dizem que a idéia partiu dos jovens de Aventurina, uma vila montanhesa cuja existência é quase uma lenda para a maior parte da população odeniana. Os garotos peregrinaram de forja em forja mostrando aos velhos uma espada longa e leve, que poderia manter os felpi afastados e perfurar através de sua pele com facilidade. Dia após dia, as novas espadas foram forjadas. Seu uso era simples – mantinha-se o felpi afastado o ameaçando com a ponta. Seguido ao bote, um golpe de perfuração com as duas mãos dava conta do recado. Golpes amplos de corte também eram usados quando os felpi faziam emboscadas – a arma era perfeita. Quando o problema terminou, os odenianos estavam próximos de um novo estilo formal de luta com espadas.

Infelizmente poucas delas sobreviveram às décadas e hoje poucos ferreiros ainda conhecem as medidas e métodos para sua construção. Alguns dedicam-se exclusivamente a criar novas espadas de Aventurina, talvez num esforço pra reviver o espírito de Odenheim de antes da passagem do Duque Negro pelo trono.

Beálaras para vidas novas.

Tudo veio bastante diferente do que eu imaginava. É tarde da noite e chegamos em um orquidário. Fomos instruídos a descansar da viagem em casinhas de adobe erguidas expedientemente há pouco tempo atrás. Por dentro elas eram lautas, porém confortáveis. Me entregaram, depois de um tempo, roupas de cama, toalhas, e travesseiros (de penas!). Passei uma noite invejável sentindo pela janela o aroma das beálaras, um tipo de orquídea invernal que só cresce nessas regiões. Conheceremos nosso novo ofício pela manhã. Imaginava que trataríamos de terras difíceis e de sobreviver por nossos próprios meios: o cultivo de flores ornamentais estava fora das minhas suposições para um país comunista sem relações comerciais amigáveis com outros países. Veremos.

Leitura: Um Pequeno Conto de Keshal de Lorena

Isso seria a testemunha de um garoto farisiense que observava ao longe, que crescera e se tornara um escritor de alguma reputação na área em que vivia, contando com palavras o que vira ao longo dos anos.

" Foi até onde seus joelhos feridos puderam lhe levar e caiu por terra, finalmente. Antes tivesse feito melhor uso de suas forças! Viu-se cercado, em tão pouco tempo. Se pudesse levantar, derrotaria todos e voltaria a andar na sua jornada impossível até Odenheim. Mas não – e as marcas da última batalha agora começavam a arder violentamente.

“Levanta, dragão, e nos dá a honra de um combate belo”.

As palavras saíam com dor. “Cale-se, Rudeger...”

Inclinou a cabeça e ergueu as sobrancelhas. “Ao que me parece, não estás em posição de falar mais das tuas insolências... ainda assim parece alimentar-te do ódio... és um soldado admirável, sir Keshal de Lorena. Devo repetir-lhe que teríamos uma vaga para alguém como tu nas nossas fileiras...? Ou és determinado e tolo a ponto de não me ouvir mais? Eu me pergunto...”

Keshal fechou a mão sobre o punho da grande espada.

“A tua é uma cruzada sem esperanças. E os melhores soldados sabem a hora de trocar bandeiras...”. Como que dominado por sua própria oratória, permitiu-se virar de costas e contemplar o luar. Keshal analisou a situação cuidadosamente. Àquela emboscada, sobreviveria. Levantou-se de sopetão, pondo-se de joelhos e depois em pé, e cambaleou para trás. Um soldado reagiu e seu golpe de lança resvalou na placa de bronze. Seu infortúnio veio na forma da espada em balanço, quebrando o cerco. Ainda uma vez, Keshal cambaleou para trás, pondo-se fora do destino certo.

Rudeger andou lentamente até o soldado caído, e os outros soldados, pegos de surpresa pela determinação do dragão, prepararam as armas e vieram em sua direção. “Gostaria que morresse, Keshal... és uma dor-de-cabeça tão grande... mas insiste em seguir tua sobrevida, tua existência miserável atravessando esse deserto.” O hierofante ajoelhou-se e cantou um milagre para o soldado derrotado.

Os outros avançaram e lutaram com Keshal brevemente. À beira da morte, o dragão pouco raciocinava além do necessário para direcionar seus golpes aos olhos e aos torsos. Seu espírito se agarrava com cada vez mais força ao seu corpo, enquanto sua armadura imponente era destruída e as lanças perfuravam seu corpo. Eram quatro contra um, mas logo um ivoreano viu-se sozinho contra o dragão de olhos frios e rosto manchado. O pânico tomou seu coração e a espada o atravessou. Keshal enterrou a lâmina no chão e escorou o corpo.

“Admirável... realmente admirável. Tomaste a vida de alguns dos nossos melhores. Gostaria de ficar para lutar contra um homem tão poderoso, mas tenho um apontamento de mais importância do que sua captura”, disse Rudeger com sinceridade. “Creio que vá ter de encontrá-lo algumas vezes mais, mas quantos homens serão necessários para que eu possa lhe ver no chão, Keshal?”

Keshal cuspiu no chão. “Venha de uma vez, Rudeger. Vamos acabar com isso!”

“Ah, não... sinceramente não é de meu desejo enfrentar-lhe agora, não nestas condições. Você parece-me muito abatido e doente, e não deve comer há dias, pobre homem. Mais algumas horas e você seguramente irá desmaiar, e então os mantídeos irão arrancar seus braços... não acredito que possa ainda lutar sem braços, concorda...? Para que fazer o trabalho da própria natureza? Olhe para você, desgraçado.”

Keshal gritou um palavrão, girou a espada no ar e enviou uma lâmina grossa de energia verde brilhante em direção ao hierofante, que a aparou com uma pequena mandala do cajado. “Teu esforço é inútil”. Rudeger desapareceu num pilar de energia torpe e nuclear. Keshal fincou a espada no chão e levantou com força. Retomou o passo. A batalha o dera forças mais uma vez, para seguir sua travessia infindável.

“O que não me mata me faz ainda mais forte”. "

Artigo: O Baixo-Éter

Ou baixio, ou marola, ou remanso, dependendo de quem você pergunta. Apesar da conotação infantil, esses termos descrevem um lugar relativamente perigoso apesar da aparência reticente. Após transcrever a redoma, uma capitânia 'cai' em uma espécie de caixa-de-areia etérica onde desliza sobre o sólido por algum tempo antes que o seu comandante possa recuperar altura e navegar com os motores. Antigamente, acreditava-se que só existia essa região ao redor de Natal, mas existe um baixio semelhante em Calibur (a Lâmina Branca) e outro no Gâm Flutuante, revelando que, possivelmente, o fenômeno geográfico do baixo-éter seja comum ao redor dos mundos.

Entrando no assunto que interessa. Esta região é perigosíssima porque é por ela que os aríetes etéricos deslizam antes de atingir a redoma. Além disso, existe uma espécie de força de empuxo que pode desorientar um barco que esteja navegando em ponto-morto. Sabe-se que os raios que ultrapassam a redoma também refletem-se com potência maior através do éter, e não foram poucas as capitânias atingidas por esses raios, sobretudo as que saem nas regiões próximas à Longinus e ao sul de Ivoire.

A partir do baixo-éter, durante a maior parte do tempo, é possível contemplar uma visão relativamente plácida do universo em que vivemos. Estações montadas em capitânias largas o suficiente são estacionadas nessas áreas para os pesquisadores erguerem suas lunetas atrás de novos mundos (desta forma foi descoberto Calibur). Quando o barco recupera altura e ganha o alto-éter, começam os influxos e as imagens (tratarei dessas mais tarde), as miragens, os maravilhamentos, e, infelizmente, chusmas de asteróides, raios e as porras das bogardinas, cegas e mortais.

Dificilmente uma viagem pelo éter poderia ser considerada prazeirosa. Não participei de uma única em que não tivessem havido acidentes e eventos inesperados, além dos muitos acidentes esperados. Não participei de uma única viagem em que, em dado momento, eu pudesse esperar chegar vivo no outro lugar.

Ofício difícil o de planinauta.

Artigo: Da Natureza da Redoma e do Portal dos Nimbos

Foi provado pelos astrônomos que a redoma degenera em 'olhos', rombos em formato de gemas arredondadas com pontas que fazem ângulos agudos. A degeneração inicial cria um 'olho marinho', uma rombo profundamente azul-escuro (como o que se espalhou sobre os céus de Hevelius após o meteoro). O olho marinho é nada mais do que um agouro; ainda há Petra Alva - a matéria divina que forma a redoma - em quantidade suficiente para bloquear as investidas do aríete etérico. Entretanto, uma mácula maior da Palavra Divina pode romper mais Petra Alva e transformar o olho pálido para uma degeneração secundária.

A degeneração secundária e mais profunda cria um 'olho monstruoso', que se espalha como tinta e tem uma coloração avermelhada (como o atual sobre os céus do Belvedere farisiense). Geralmente ocupa uma área muito maior, transformando o céu de uma área inteira em um degradê gigante. Neste nível, tempestades elétricas e catástrofes já são um pouco mais freqüentes à medida que quantidades relativamente pequenas de éter são absorvidas pela redoma e jogadas para dentro em forma de eletricidade.

A degeneração terciária, o 'olho pálido', é raríssima. Muitas vezes a redoma atravessa rapidamente este estágio (que indica uma película muito fina) para um buraco completo, uma 'arrebentação', causando uma inundação elétrica e mudanças no clima em escala mundial, bem como um reavivamento da Conjuração. O fenômeno da arrebentação redômica foi registrado cinco vezes na história, quatro vezes em Longinus e uma única vez em Ivoire, mas estima-se que tenha acontecido muitas outras vezes desde a habitação da terceira civilização e inúmeras vezes durante o apogeu do Segundo Povo, os djins.

Toda arrebentação cria uma reação redômica rapidíssima que evoca Petra Alva de várias partes do mundo para preencher o rombo, muitas vezes arrancando maiores quantidades de Petra Alva das partes mais distantes do rombo.

Infelizmente, está praticamente fora do controle dos homens a natureza da Petra Alva e da formação da redoma. Supõe-se que todos os estágios da formação e cristalização da redoma sejam de natureza divina, incompreensível para a ciência dos homens. Houveram tentativas de produzir Petra Alva em Ivoire em 344 D.F. e novamente em 510 D.F., a primeira resultando em uma catástrofe terrível, e a segunda obtendo uma parcela pequena de sucesso, porém secando permanentemente a terra ivoreana, tornando-a infértil para muitos tipos de vida vegetal, como se alguma espécie de quinta-essência houvesse sido arrancada da terra no processo. Os limites periféricos atuais de Faris também incluem um pouco desta terra seca ivoreana.

Odenheim, há quase meio-século e por influência de investidores cedarianos, investiu milhões de rúpias em uma frota de capitanias que, estacionados próximos ao limite do mundo, puderam estudar um raríssimo olho pálido estacionado próximo à altura do mar, no perímetro sudeste de Natal. Foi descoberto que capitanias poderiam atravessar o local com relativa facildade durante algumas épocas do ano, quando o olho pálido pode ser alcançado com a cheia das marés. Um pequeno número de capitânias pôde passar, muito lentamente, pelo olho pálido, sem estourar a película, mas o trânsito foi suspenso desde 722 D.F. por motivos de segurança. Estima-se que, se houver uma tempestade elétrica entrando em altitude tão baixa, os raios etéricos possam congelar um raio contínuo no mar, afundando uma estalagmite de gelo de quilômetros e causando catástrofes marítimas em todas as cidades portuárias, seguidas por uma queda considerável do nível do mar.

Este portal, chamado Portal dos Nimbos pela permanente névoa d'água erguida ao redor dele e pela fraca visibilidade, através da fumaça, dos obeliscos de pedra que delimitam o olho pálido, está interditado há muito tempo inclusive com relação ao trânsito paralelo de barcos pelo Cinturão; viajantes devem abandonar o Cinturão antes de passar pelo Portal ou entrar nele após seu comprimento. Este decreto odeniano vem instigando alguns poucos conflitos diplomáticos ao longo da história, já que muitos navios se avariam no processo de sair do Cinturão e depois voltar a ele. Alguns espertos ancoraram grandes barcos-oficinas próximos ao Portal, prontos a ajudar e cobrar os olhos da cara de todos que sofrerem acidentes de percurso.

Mudando convenientemente de assunto, vale explicar a terminologia 'aríete etérico'. Existe uma força constante de pressão que o éter exerce sob a redoma (que é, segundo os astrônomos, o motivo pelo qual ela é mantida em forma vagamente semi-esférica). Entretanto, por vezes o éter se avoluma em uma espécie de turbilhão grosso como uma tora, e investe, como se fosse senciente, contra a redoma. O golpe, quando é forte o suficiente, pode até penetrá-la em estado intacto, mas penetra mais facilmente redomas degeneradas com níveis a partir do secundário. A este golpe se dá o nome de 'aríete etérico', um fenômeno relativamente comum durante alguns meses do ano.

Artigo: As Mandalas

A maioria dos adeptos conhece uma prece simples, porém perigosa, que serve para convidar um Altíssimo à submissão. A maior parte dos Altíssimos pede testes de batalha e de fé, oferecendo combate ao adepto e aos seus prováveis aliados. Quando o Altíssimo considera-se derrotado e conclui que a humanidade merece seu poder, seu avantesma projeta com luz, pelos olhos, boca, peito ou de outra maneira, uma Mandala Prima no chão.

A Mandala Prima, então, deve ser construída, no mesmo lugar, com prata, feldspar, ferro, madeira nobre, ouro, aur ou outro material, sempre com exatidão de detalhes. Ali, também deverá ser construído um templo em honra do altíssimo. Só então, ele poderá oferecer seu poder em forma de milagres, e na forma brilhante do seu avantesma. A Mandala representa a consciência elevada do altíssimo e é a chave para seu controle. Portanto, um adepto pode usar-se de um altíssimo a partir do momento que conhece sua mandala (o que é um processo mais longo do que a maioria das pessoas supõe).

A invocação de milagres se dá com o uso figurado ou físico de variações mínimas na mandala do altíssimo. O repertório de milagres de cada um é supostamente ilimitado dentro de seu aspecto, mas para cada um existe um estudo escolástico definido e, apesar do poder do altíssimo beirar o infinito, a compreensão de um templo como um todo sobre ele define o limite de poder que seus adeptos podem alcançar.

Muitos milagres requerem Solo Consagrado. Eles, portanto, funcionarão apenas em um lugar onde esteja presente a sua mandala relativa, ou em um lugar que esteja cercado por ela. O adepto muitas vezes precisa cunhar a mandala do próprio punho neste caso, ou realizar o milagre dentro do templo.

A invocação do avantesma em si se dá com o talhamento da Mandala Prima com o máximo de perfeição possível (erros nesse processo podem irritar o avantesma) e com a prática dos ritos que o altíssimo exige.

Por motivos óbvios, muitas vezes adeptos que sejam abastados ou carismáticos o suficiente são seguidos por artistas iniciados na tradição sacra que, apesar de não terem passado pela Infusão, conhecem as formas das mandalas e podem as talhar para os adeptos.