Artigo: A Civilização Cahuilla

Entre uma etnia huma e uma conjuração, os cahuilla vivem nas friorentas ilhas de Agustine e Ramona, do oceano Infra. De pele avermelhada, feições sinceras e cabelos muito longos de cor negra ou cinzenta, são tementes a Maeve na forma de uma cahuilla terna de cabelos negros e manto que formam todos os mundos e se desfazem em efêmera. Existem em número de poucas centenas e são resguardados como uma espécie de pequena nação independente apesar de estarem em território oficialmente cedariano.

Sua organização social é tribal, mas têm fortes ascendentes culturais e uma mitologia riquíssima que inclui quase tudo de Natal. Existem sacerdotes entre eles, seguidores dos altíssimos que olham por suas ilhas: Sungrey e Muut. São atiradores incríveis e dominam plenamente o uso da pólvora; mandam barcos com os produtos raros de sua terra em troca de armas de fogo cedarianas, que usam para defender suas ilhas de piratas farisienses e de conjurações agressivas.
Os cahuilla, como um povo, têm grande afinidade com uma espécie de conjuração nativa de Agustine chamada 'pushani', pássaros que variam de cor branca até castanha, passando por um cinzenta malhado. Os pushani são, segundo os cahuilla, representantes de Muut no mundo físico; têm olhos grandes e sábios, cabeça redonda, corpo grande e achatado, e bicos curtos, afiados e virados para baixo. Os pushani são para os cahuilla o que os felpi são para os odenianos; segundo eles, os pushani os guiam depois de mortos para o encontro derradeiro com Maeve.

Tratando de personalidade, para alguém que venha do continente, o cahuilla sempre parecerá distante, sonhador. Os cahuilla sempre procuram respostas filosóficas para as coisas e tendem a pensar devagar. Uns poucos vão com os navios que levam as coisas de sua terra para Cédara e não voltam mais, abandonando o seio de suas famílias para viver do lado de fora uma existência real. Tendem ao altruísmo e à honra, que são as virtudes ensinadas por seu deus da morte Muut. Muitos vieram em auxílio dos farisienses que caíram assim que souberam que haviam tantos necessitados em terras do norte.

Assim como boa parte dos farisienses, os cahuilla não se impressionam com tecnologia e sempre acham maneiras de fazer as mesmas coisas de maneira mais natural. Não são amantes da natureza como um povo, mas nutrem profundo respeito por tudo que é vivo. Sua mitologia volta em tempos imemoriais e se confunde em vários aspectos: nem eles sabem dizer há quanto tempo vivem naquele lugar. Não dominam ciências náuticas mas sempre estão curiosos para aprendê-las; muito poucos sabem nadar, escalar ou lutar com proficiência. O domínio deles se restringe a tiros perfeitos com armas de fogo e, se elas não estiverem disponíveis, a arremessos de objetos, lanças, pedras, o que estiver a mão.

A filosofia dos cahuilla está centrada no fim da existência terrena. Eles acreditam que precisam de discernimento e iluminação para que possam encontrar os caminhos certos em outros mundos, e passam a vida adestrando seus espíritos. Muitos deles acabam por dominar plenamente ciências naturais e meditação; são completamente alheios à geomancias e feitiços. Muitos não vêem diferença entre um e outro.

Os cahuilla falam quase sempre empregando metáforas difíceis e arcanas. Adoram aprender novas palavras e seus significados, principalmente palavras em titani. Tendem a pensar em qualquer conjuração como caça afora seus adorados pushani, e acham que os felpi parecem monstros. São fascinados por pesadelos e seus significados ocultos, e vivem encontrando presságios em acontecimentos suspeitos do dia-a-dia. Conviver com um cahuilla é mergulhar em uma existência mística sem volta.

O povo cahuilla tem uma amizade inocente e forte pelos cedarianos, e tende a pensar neles como verdadeiros suportes neste mundo. Eles já desistiram de educá-los nas verdades segundo Muut e na verdadeira natureza de Maeve, apesar de sempre haverem tentativas. Existe, sobretudo, um respeito mútuo forte entre os dois povos. Se Cédara viesse a entrar em guerra contra forasteiros desconhecidos, os cahuilla os apoiariam incondicionalmente e seriam os melhores dentre os atiradores em suas fileiras.

As funções sociais dos cahuilla são poucas e bem-definidas. Vivem numa sociedade onde o mérito é recompensado com hierarquia, e não há nenhuma virtude em ser descendente de um herói a não ser que o descendente tenha alguma fração de seu poder e sabedoria. Os sacerdotes formam a casta comandante numa espécie de teocracia que migra de lugar em lugar usando os recursos da áreas que passam. Os que seguem Muut são conselheiros espirituais, parteiros e pais para todos, em oposição a estruturas fixas de família. Os que seguem Sungrey estudam as artes das curas e a natureza. Seguindo os sacerdotes, vêm os atiradores, detentores de armas cedarianas e mortíferos para as conjurações que cruzem seu caminho. As mulheres são mais respeitadas do que os homens por viverem mais, e suas vidas são guardadas com zelo, apesar de com freqüência a maior parte das atiradoras serem mulheres. Os outros erguem barracas, escavam armadilhas e trabalham com as plantas que houverem no local. Organizam-se em estruturas de vinte a trinta pessoas, nunca passando muito disso. A civilização vem caindo em número a medida que cada vez mais cahuilla abandonam suas terras para aventurar-se do lado de fora e acabam não deixando descendentes.

Existe uma espécie de ritual de união entre os cahuilla que é quase um casamento entre um homem e uma mulher. Dentre seus costumes, o linweha é permitir que as luas encontrem o casal desnudo em locais sagrados da tradição, e a união é permanente. Antecedem este ritual anos de provação: o homem deve saber que a mulher o ama verdadeiramente e vice-versa, muitas vezes por meio da imposição de testes cruéis. Eles são psicologicamente incapazes de atrair-se pelo sexo oposto sem esta preparação toda, por isso sendo complicada ou impossível a reprodução com outras raças.

Outro ritual da tradição é o takic onde uma vestimenta (na maioria das vezes mantos de frio confeccionados de couro) é sacramentada em seu dono e se torna parte espiritual dele. Vestimentas simples e sem enfeites (normalmente tiras coloridas, penas) indicam um cahuilla humilde, ou sem orgulho. Vestes negras tingidas com extratos de árvores setentrionais são as de cahuillas criminosos e exilados do convívio com os outros. Só por meio de uma virtude filosófica muito grande a memória de um exilado pode ser limpa, e normalmente isso só acontece após sua morte ou se ele for inocentado do que fez de alguma maneira. Na maioria das vezes, uma suspeita é suficiente para um cahuilla acusar. Eles não têm rodeios quando assuntos de honra estão em jogo.

Como muitas outras coisas, os cedarianos ocultaram por séculos a existência dos cahuilla, mas eles (apesar de tentarem) não podem evitar que eles ganhem o continente e se mostrem ao mundo. Nenhum mentirá sobre o lugar de onde veio de bom-grado, pois têm orgulho de serem o que são no mundo.

Artigo: Os Montanheses de Faris

... farisienses do oeste, os montanheses, sempre foram muito mais ligados à religião e à tradição do que seus conterrâneos do litoral alvo. Viviam das cordilheiras em inocência, vilas pequenas, muitas sem estrelas, muitos deles só viam outros lugares quando nasciam ou quando escoltavam suas esposas para que dessem à luz. Talvez por esses e outros fatos, os farisienses da costa leste teimassem tanto em chamá-los 'caipiras' e outros apelidos pejorativos.

A maioria dos montanheses tem a fala vagarosa e suave, carregada com um sotaque característico da região. Eles têm uma inteligência simples e são donos de um bom-senso continental, apesar de alguns serem simples o bastante para não terem aprendido a ler. Impressionam-se muito menos do que o esperado com coisas tecnológicas, mas acabam aprendendo a operá-las bem. São fortes, inocentes, arredios e bondosos, talvez como Maeve quisesse que fossem todos os humas, e como se o plano só tivesse dado certo com eles.

Entre os montanheses há os que acham que são ótimos, e os que são muito humildes. Há quem pense que os longinianos são estranhos, e que os cedarianos só querem o bem para si próprios – e talvez não estejam errados. Existem montanheses responsáveis, existem os que sonham em viajar, existem os que tiveram seus sonhos destruídos por uma guerra que eles não iniciaram. O que une todos eles no final das contas é um respeito muito grande pela terra e por tudo que foi lhes concedido como um presente, e, talvez, uma raiva incontida dos ivoreanos e talvez até dos outros farisienses, que fizeram ou deixaram tudo de ruim acontecer com as boas terras em que viviam.

Hoje em dia eles estão na pior das piores. Separados de suas famílias, suas casas perdidas, sem amigos e sem horizontes, eles vagam junto a caravanas ou solitariamente por Faris em busca de almas que lhes façam companhia. Os que defenderam os seus dos feiticeiros do clã Grendel ou os fafnires que ora reclamavam as terras ainda têm seus machados de lâminas únicas e retas por companhia para derrubar qualquer um que se meta entre eles e qualquer espécie de felicidade. Os que porventura tiveram sangue longiniano entre seus ancestrais podem ter aquele olhar noturno e místico que só eles dominam, e talvez algum talento a mais para se mover com graça e falar com a cabeça erguida. E os que pela guerra vieram a nascer sem a luz sabem que terão pouco tempo para achar algo que valha a pena nesta vida.

Fisicamente, eles estão distantes da pele mais alva da costa leste. Queimados de sol e com os olhos mais claros, são vigorosos e aprenderam a suportar muitas coisas frente às quais seus primos costeiros desistiriam. Metidos no meio das caravanas de hoje em dia, muitas vezes as pessoas precisam vir a eles perguntar sobre coisas simples da natureza que eles sabem melhor do que quase todo mundo. É difícil um montanhês não saber o caminho a tomar ou se vai chover ou fazer sol no dia seguinte. As nuvens são palavras muito bem escritas para eles, e os pastores de nuvens de Buriash são alvo de admiração e respeito instantâneo.

Nascidos antes ou depois de tudo acontecer, todos têm saudade do tempo em que tinham certeza que tudo estaria no mesmo lugar no dia seguinte e as plantas estariam maiores um pouco, quase boas para colher. Os dias que eles podiam buscar água nas nascentes das montanhas e beber com abundância, sem pensar que logo depois pode faltar para outra pessoa. Mais do que todos, eles lutarão para colocar Faris de pé.

Artigo: A Marcha da Ordem Pristina sobre Lodis

Eu não acredito que perdi isso. Então, Ivaness chega a Lodis e toma conhecimento de que a Ordem Pristina e aqueles vagabundos transgressores marcharam com avantesmas, fúria e glória sobre as ruas de Lodis. Mais incrível que isso, não houve retaliação armada, mas apoio e quebra-quebra, e chegaram às portas do Palácio Oceânico todos que entraram pelos portões que foram abertos por dentro. Nem um aríete. E os estandartes azuis da ordem desfraldados nas muralhas.

Lorde Gunther Quirian, Senhor dos Mares é parte do conselho agora. Não vão inventar uma cor de elmo para ele. A Quimera já não é mais - a Quimera já era.

Artigo: Instrumentos Percutidos da Antiga Rublo

Perdoem-me a inexatidão do título. Tudo que será tratado aqui diz respeito às tradições da antiga ilha-sul de Odenheim que, hoje, força do destino, chama-se Rublo.

Quando eu era mais jovem, uns 30 anos que os valham, eu estive com meu pai - meu pai viajava um bocado - de vila em vila no interior de Rublo. Eu me lembro de muita coisa dessas viajens. Meu pai era um terror no meio das meninas, parecia um garoto, não um setentão velho de guerra da coroa. Nós pudemos ver uma coisa rara e fantástica durante essas andanças. Essas palavras eu escrevi na época, poucos dias depois do acontecido.

Eu tenho um hábito de jogar fora todos os meus textos que encontro daquela época. Eu era diferente, quase arrogante, me considerava um ser especial e achava que todos deveriam ficar atônitos com minha grande sabedoria e minhas sacadas sobre a vida.

Esse texto eu não joguei fora, não. Eu estava maravilhado quando escrevi (o efeito durou sobre mim uns bons dias depois do que eu vi - eu tinha enchido a cara, também). Eu estava me sentindo tão bem e tão humilde, tão pequeno frente à maravilha que os homens inspirados poderiam fazer, tão diferente de mim mesmo. Peguei do papel e fiz pra mim mesmo o favor de registrar aquelas palavras que estavam brotando de mim.

"Esse ano foi difícil pra eles, foi um ano em que não estava vindo ajuda de lugar nenhum, nem os felpi e nem os cavaleiros do norte. E a neve estava impiedosa sobre a terra, a deixando esturricada, ruim para plantar. Mas ninguém chegou a passar fome. Aquele sol glorioso fez tudo encharcado, mas estavam dançando encharcados com aquela neve que havia sido banida, esconjurada.

Naquela noite houve tanto vinho, o vinho de dez casamentos, e houveram grandes tambores de água ribombando para fazer-nos tremer por dentro. Houve uma música divina, uma música de salvamento, uma música que viera para nos fazer perceber o quanto Maeve nos amava.

Aqueles tambores de água recém-degelada devem ter sido usados só daquela vez e nunca mais, e sorte de quem viu a dança sob o sol quase no fim da tarde, anunciando que todos estariam salvos. Eu e meu pai poderíamos pegar nossos trenós e partir dali o mais rápido possível, mas aquele povo em espera estava apertando nossos corações. A glória de Nila é um tambor de água, um tambor espontâneo, desritmado, reverberante, impreciso, e milagroso."

Artigo: A Música Folclórica Firrareana em Rublo

Um único instrumento inspirou quase toda a tradição de um país inteiro. A kitarra firrareana é uma espécie de violão de som metálico e reverberante, com graves possantes e três cordas. Os maiores tocadores têm agilidade incrível na mão esquerda. A kitarra só faz acordes simples, é um instrumento essencialmente gentio, dedicado ao folclore. Algumas peças chantelianas (sobretudo óperas) incluem kitarras, mas no momento que elas tocam a orquestra toda simplifica-se para adeqüar-se à natureza das três cordas.

O repertório folclórico de Rublo é vasto como os interiores do país. São canções sobre pastores, damas sussurrantes, noites de frio e amores impossíveis, o medo da guerra e da desolação, a esperança sempre num novo dia, e avantesmas dos rios e seus mistérios. Quando dois músicos se encontram é costume que troquem músicas. Ninguém respeita conceitos de autoria das músicas, todas são de todos, devem pensar que os músicos apenas alcançam coisas diferentes num único e imenso poço de idéias.

Na verdade, a simplicidade da música da kitarra faz com que todas fiquem muito parecidas. O repertório de idéias poéticas da vida interiorana de Rublo, apesar de lindo, é limitado. A maioria dos músicos repete as idéias que as pessoas querem ouvir: um sonho de simplicidade e fantasia, um sonho de pessoas impressionáveis, pessoas de fé e pessoas que apaixonam-se com inocência. Um ou outro músico persegue uma nova fronteira na poesia, ou conta um caso mais diferente. Muitos músicos ficam conhecidos por suas músicas características. Eles todos formam uma espécie de fraternidade onde uns ajudam os outros, já que não têm muito lugar em um país socialista onde não há tempo para ócio e diversão.

Por isto mesmo, a maioria dos caras que fazem essas músicas procuram agora uma maneira de levar seus passos a outros lugares que os recebam com dinheiro e agradecimentos. Enquanto, talvez, bom para o povo, o socialismo virá a matar quase tudo que um dia foi a face de Rublo para o mundo, inclusive a riquinha e pequena cidade portuária que deu o nome para o país. Seus ladrilhos já estão sendo invadidos pela grama. Pouco depois, as construções racham com as eras. A natureza gosta de morar onde nós deixamos. Será que Iamni esquecerá tanto assim do passado?

Artigo: O Flautim de Wilm

O flautim rublense é uma miniatura de flauta pequena e preta, feita de uma madeira especialíssima que cresce esparsamente no norte do país. Seu som é doce e agudo, mas um agudo cantante que não machuca os ouvidos nem se soprado com força. Como ninguém agüenta ouvir uma flauta monofônica por muito tempo sozinha, os flauteiros (não flautistas: quem toca flauta, aquela tranversa de orquestra chanteliana, é flautista. Quem toca flautim é flauteiro. Eu também acho feio) tocavam com os kitarristas. A proporção de flauteiros para acompanhadores sempre foi desleal. Qualquer criança com uma partitura poderia aprender rapidamente o flautim com sua mecânica simples. Assim, as professoras de Rublo aprendem a tocar a kitarra e acompanham a pequena orquestra de seus alunos, o som assemelhando-se a uma brisa doce vindo com todos aqueles flautins.

A necessidade de instrumentos de tessitura mais grave fez com que os artífices de tempos antigos viessem com um flautim aumentado e mais grosso, semelhante a uma clarineta, chamado briso. Além dos furos, o briso tem uma vareta abafada que regula a altura do som, conferindo uma extensão de graves e médios fantástica. O som do briso é soprado e doce, quase sem agudos. Um briso soprado sem propensões musicais soa como o vento, como a natureza, como um som que se ouve num eco ou qualquer coisa assim. Só ouvindo. Tem alguma coisa mística naquilo.

Compositores eruditos algumas vezes escrevem peças utilizando brisos e flautins, numa espécie de demonstração de simpatia pela tradição simples dos rublenses. Poucos conseguem um som legítimo: até os melhores sempre subvertem a simplicidade dos instrumentos a contextos complicados e harmonias difíceis, que um camponês nunca entenderia.

Eu deveria ser o último a falar mal da erudição, mas basta você soprar um briso para entender que nada do que se estuda vale mais do que o que se sente com o coração.

Sem piadinhas aí comigo.

Artigo: Os Distritos de Gradec

Um dos distritos mais famosos do condado de Gradec entre os aristocratas é o Alcarin, constituído por três ruas paralelas com galerias as interligando onde se faz o comércio de ervas ornamentais, sementes e flores. O bairro é dominado por uma miríade de bancadas com muitas sementes coloridas e flores exuberantes. O chão de ladrilhos é mantido sempre limpo, apesar de, no final do dia, haver alguma sujeira de flores pisoteadas. Buquês enormes podem ser adquiridos a preços bastante razoáveis com os floristas do Alcarin; no final da tarde, o bairro se enche de noivos e namorados atrás de presentes. Outro tipo que se vê com freqüência são os alquimistas atrás de flores raras e de sementes que possam cultivar. Os floristas não gostam de vender sementes para os alquimistas, já que isso significa perda de clientela permanente para eles. Cuidadas da maneira certa, a maioria das sementes vendidas no bairro Alcarin crescem de maneira extraordinária e dão belas flores e frutos. À noite, são comerciados todos os tipos de poções, sempre postas sobre tapetes de flores em belos frascos para impressionar os aventureiros de passagem pela cidade, que geralmente vão embora pela manhã.

Do outro lado da cidade fica uma área residencial feita de prédios estreitos construídos parede a parede uns com os outros. Muitos ficam de frente para herbários particulares dos moradores, de onde muitos tiram o sustento. O padrão de vida de Gradec é alto, possivelmente um dos maiores de Odenheim, perdendo, talvez, para Lodis e Vercel, cidades mais favorecidas politicamente. Gradec perde muito dinheiro com transporte de ervas para os portos - se fosse uma cidade portuária, ou com uma ligação direta com um porto, com certeza seria pelo menos duas vezes mais rica, já que quase setenta por cento da produção de Gradec é destinada à exportação.

Um dos maiores e mais misteriosos investimentos do conde Terrance o Alvo é a compra de grandes tanques de água cristalina quase-congelada das nascentes de Wolfram. Elas vêm pelos portos do leste, numa operação caríssima e pouco entendida pelas pessoas. O conde Terrance construiu uma espécie de represa subterrânea na cidade onde toda a água é mantida. Até agora, a única mudança que houve é que ficou ainda mais frio na cidade e houve uma ligeira queda na produção das flores delicadas; a maior parte do povo, contudo, confia no conde Terrance e imagina que alguma coisa boa virá desta empreitada.

Artigo: Aias

Aias, Odon heliptera, são uma espécie de inseto pequeno comum próximos de lagos e outros corpos parados de água. As aias têm grandes asas translúcidas, olhos multifacetados e corpos de coloração azul metálica. Alimentam-se de outros insetos pequenos, normalmente mantendo a população destes em um nível que não incomoda ninguém. Seu abdômen tem uma substância fosforecente que brilha à noite de uma maneira pálida, normalmente em épocas de acasalamento. São nativas dos lugares mais frios em Odenheim mas migram quando os lagos congelam, geralmente para a costa leste de Faris. À noite, quando voam em bandos sobre o Mar Alvo, causam pânico nos barcos muitas vezes por serem facilmente confundidas com cálciferes à distância.

Estima-se que as ancestrais das aias contemporâneas fossem capazes de concentrar geomancias dos outros, como se fossem receptáculos, e desta energia vem a luz que as aias emitem à noite. Existem damdarans que juram que ainda é possível fazê-lo com as aias de hoje em dia, apesar da dificuldade de manter a pequena criatura por perto.

Segundo os damdarans, as aias vivem de uma maneira hedonista, interessando-se em diversões como navegar entre galhos de árvores e provocar animais brilhando inconstantemente e fazendo-os se perderem de seus donos em perseguição. Elas são completamente incapazes de se comunicar, mas assustam-se quando são chamadas pelo nome em titani ("elas acham que o seu trabalho já foi feito e que nunca mais vão precisar preocupar-se com nada, e por isso fogem quando chamadas pelo mesmo nome que eram chamadas há tanto tempo"). Diz-se em áreas rurais de Rublo que uma aia pode acender um galho de árvore e criar um incêndio se irritada ou capturada. A maioria dos damdarans não gosta das aias e nem do comportamento delas.

Além da variedade azul mais comum, existem várias espécies de aia, como a asa-aberta esmeralda, Odon dryas, a asa-de-jóia ivoreana, Odon calopteryx, a dardo-negro ocidental, Odon hetaerin, e a cauda-anel azul, Odon lecarin. A asa-aberta esmeralda e a asa-de-jóia de Ivoire vivem em regiões Oeste de Natal e são adaptadas ao calor. A dardo-negro ocidental é uma aia munida de um ferrão que vive no norte de Faris, e emite uma misteriosa "luz negra", uma luminosidade púrpura misteriosa que faz coisas brancas brilharem. A cauda-anel azul é uma variedade maior da aia odeniana que vive na parte mais oriental da República.

Artigo: Mikasas

As capitânias da série Mikasa, nativa cedariana e largamente empregadas pelos Cranequin em suas operações, são leves e comportam uma tripulação de, no máximo, oito pessoas. Armadas com turbinas duplas, podem desenvolver velocidades superiores a 40 nós em mares internos e mais de 105 nós no éter. Sua blindagem é toda feita de aço e cromo (a isto chamam Armadura Crupe); elas têm um formato vagamente losangular e empregam três capotas para a transição. Possuem uma metralhadora pesada Matra montada em sua torre principal externa, e são adaptáveis para diversos armamentos, inclusive torpedos de alto alcance. Têm casários confortáveis, com corredores estreitos e beliches. O trabalho interno de madeira é impecável nas Mikasa industrializadas, com móveis adaptados que se encaixam nas paredes quando estão fora de uso. As Mikasa também têm cozinhas internas e uma área de lazer de razoável espaço, tudo em uma capitânia de pouco menos de vinte metros de comprimento total.

As Mikasa revolucionaram toda uma classe de capitânia leve híbrida em seu tempo por possuirem um par de asas largas e triangulares, retráteis, que fazem a função de planadores no éter. Em mares revoltos, as primeiras ondas impulsionam a Mikasa para o alto e lá ela permanece, usando esporadicamente as turbinas para ganhar altura e mantendo-se em segurança. Os planinautas chamam esta manobra de "eteroplanar" ou "fazer o vôo de Uraeus".

Feitas a partir de projetos originais ivoreanos, as série-Mikasa geralmente carregam vários traços de seus donos. Portam muitas vezes aerografias arrogantes e grandes bandeiras (grandes mesmo) em mastros inclinados, portando motivos guerreiros, logotipos de marcas de vinho, escudos de clubes, e brasões de família. A maioria das capitânias de esquadra têm ordem de se afastar à detecção de uma Mikasa, porque o comportamento dos Cranequin é muitas vezes imprevisível e eles não perdem muitas oportunidades de assaltos em alto-éter.

Artigo: A Cranequin

Centenas de burgueses cedarianos todo ano lunar se encalacram em dinheiro com a Cranequin, a maior e mais desorganizada máfia cedariana, composta de, basicamente, investidores e agentes, ou seja, planinautas loucos o bastante. Travessia para outros mundos é quase uma brincadeira para eles. Habilidosos, metódicos e desleais, são especializados em táticas de combate no éter, assaltos invisíveis, exploração ilegal, artilharia, serviços de escolta mercenária fora de mundos e navegação distante, ou seja, chegar a lugares inéditos pra planinautas pertencentes a ordens reais. Os Cranequin têm catálogos de segredos sobre mundos distantes e estes são vendidos às pessoas certas a preços exorbitantes. E, mais freqüentemente, burgueses cedarianos cedem somas incríveis de dinheiro como investimento aos Cranequin, que sabem pagar este tipo de coisa com muito bom grado.

A família Rampost Cranequin já não existe há muito tempo. Foram exterminados ao longo do último século em uma longa vendeta com várias outras famílias. Conhecidos por sua união e devoção incontestável aos interesses da família e por seus atos extravagantes (como membros que assumiram assassinatos publicamente, fizeram assaltos grandiosos à luz do dia e, principalmente, levaram as velhas capitânias do século passado ao seu limite), eles ganharam ao longo de sua existência inimigos terríveis. Todos os Rampost Cranequin sobreviventes hoje têm outros nomes ou vivem longe de Cédara, mantendo uma suposta segurança.

Envoltos em muitos mistérios e rivalidades, os Cranequin não têm medo de se mostrar em público. Eu poderia dizer que a estrutura política de Cédara é podre o suficiente para eles poderem não se preocupar, contanto que não sejam pegos em flagrante. Mesmo assim há uma grande chance de serem ignorados ou liberados. Todos sabem que a Cranequin não perdoa autoridades que acham que podem exercer qualquer poder, ainda mais sobre eles. E todos sabem, principalmente, que a Cranequin recompensa certos tipos de discrição.

Todos os Cranequin carregam uma arma chamada gastrafetes que é uma espécie de besta-pistola de metal rápida usada com uma só mão, que normalmente também compreende um revólver de impacto e utiliza vários tipos de encantamentos. É adaptada para funcionar ainda melhor no éter, produzindo faíscas que transformam-na numa espécie de arma de contato que descarrega choques poderosos. Todos também usam uma manopla (na mão esquerda) concedida pelo patrono ou empregador atual; enquanto usarem-a, estarão moralmente obrigados a manter a lealdade. Entretanto, podem recusar ou retirar seus votos (normalmente junto com o dinheiro do pobre homem) atirando a manopla aos pés do patrono.

Atualmente existe uma quantidade relativamente de farisienses e odenianos carregando estas gastrafetes e apavorando os guardas de portal. A liderança da organização parte de altos escalões políticos de Cédara mas a maioria dos Cranequin responde a outros Cranequin mais antigos, que "adotam" o novato até que ele possa ter o respeito que é necessário para conhecer os "grandes". Aliás, muitos dos "títulos" da organização são adjetivos de grandeza como estes.

Respaldados por autoridades compradas e donos de, talvez, as melhores capitânias de pequeno porte, os Cranequin providenciam histórias quase diariamente para que (principalmente) os aristocratas odenianos se aborreçam. Para piorar as coisas, todos os Cranequin têm uma espécie de status diplomático que impede que eles sejam julgados fora de Cédara, porque "a imagem errada que a digna organização mercante tem em outros países muitas vezes leva as autoridades a cometerem deslizes em seus julgamentos."

Artigo: A Magna Ordem dos Números

A Magna Ordem dos Números, ou “Ordem dos Numerólogos” foi fundada secretamente por Ld. Galen Melville Roch, que a liderou por seus quinze últimos anos de vida. Com uma tardia infusão, sendo um adepto fraco e um astrônomo ignorado, apesar de grande estudioso e respeitadíssimo nos círculos acadêmicos, ele descobriu sozinho o princípio da Equivalência, uma teoria sólida e manipulável com pequenos sortilégios, que poderia alcançar grande efetividade. Lorde Roch propriamente obteve pequenos sucessos em sua experiência pessoal com a Teoria da Equivalência, mas seus discípulos desenvolveram a ordem astronômica muito além do que ele sonharia.

Em 727 D.F., por divergências políticas internas, a Magna Ordem Odeniana foi excluída da Real União e sanções pesadas lhe foram impostas, levando-a rapidamente à bancarrota. Os astrônomos membros da M.O.O.N. a reergueram com seus próprios recursos e este sistema está mantido até hoje: para receber alguns livros e ensinamentos eles pagam taxas, bem como para cada uso individual de seus sortilégios. Os astrônomos da Magna Ordem têm status apenas em Odenheim; em outros lugares, a partir do momento que souberem que pertencem a uma ordem banida, devem assumir Status -1; todos devem jurar lealdade à M.O.O.N. e nunca fraudar o imposto, que é a única coisa que mantém a ordem viva.

Artigo: A Escolta Patriótica de Rublo

Em Rublo, aos adeptos representantes do Ministro Maynard dá-se o nome de "emires", que entre muitas outras funções, devem, em suas caminhadas diárias por todo o solo de Rublo, escolher dentre os aldeões os melhores, mais inteligentes e fortes, para compor a Digna Escolta Patriótica de Rublo, um pequeno exército de vigiadores solitários munidos com rádios de altíssima freqüência, sinalizadores e boas armas trazidas de Cédara. Como Rublo não tem condição de munir muita gente, os emires são seletivos e determinados em encontrar os mais aptos. A vida de um vigiador da E.P.R. é muito mais difícil e até menos recompensadora do que a vida de um aldeão, então a maioria das pessoas mais teme do que deseja ser escolhida.

Com boa parte dos portos abandonada, a costa de Rublo tornou-se um lugar quieto e vazio. O propósito da existência dos vigiadores é solitariamente cruzar estes limites, sempre com os olhos no mar, reportando qualquer movimento para Veruna. Desde a instituição da E.P.R. há quase vinte anos, o único caso de relevância foi quando uma pequena frota de guerra ivoreana estacionou ao sul da Cidade Nova e lá permaneceu por duas luas, aparentemente sem comunicação com a capital. A arrogância e prepotência dos rublenses neste caso quase rendeu um bombardeio pardo, e os ivoreanos aparentemente nunca tomaram conhecimento do motivo daquela armada estacionada ali.

Artigo: O Diamante de Wilm

A Cordilheira de Wilm é o nome que se dá para a região montanhosa que divide o final do estreito com Ayanan, ou, para vocês, jovens, a República de Rublo. Em Wilm repousam quatro torres-fortalezas construídas sob os altíssimos poderosos da Constelação de Hélice, pelos dois Imperadores Remus durante seus longos reinados. Todas elas, bem como suas terras e armas, ficaram para o comunismo: as quatro hoje formam o baluarte que, talvez, tenha desencorajado Meredith a atacar Rublo por terra.

A primeira delas foi Labrys, sob Terminus. Como Labrys veio a se tornar, além de uma fortaleza, uma cidade de trocas e de passagem, encarregada da taxação e do controle de todo tráfego entre Rublo e Oden, e, sobretudo pela vontade dos novos donos da terra, Labrys tornou-se Primeira Fortaleza Terminus, uma grande cidade murada, hoje dominada por peões, adeptos, estudiosos e muita gente, transformando uma cidade da guerra numa espécie de cortiço imenso, onde escudos funcionam como janelas e lanças espetadas no chão viram varais. Um odeniano provavelmente ficaria horrorizado com as armorarias cheias de mato e as muralhas dominadas pela hera, mas arrisco dizer que o povo lá vive bem contente.

A segunda fortaleza foi Vervain, sob Voltumna, o Cúmulo Recorrente. Esta fortaleza e templo das chuvas está atualmente abandonada: construída em um pináculo rochoso, tem pouca utilidade para a agricultura. Quando os salteadores e proscritos criarem coragem para empurrar aquelas grandes portas duplas de aur e arquirrocha (arquirrocha ou "rocha celeste" é uma espécie de pedra azul-escura profunda, quase preta, fácil de trabalhar e bastante sólida, muito usada em grandes portões), como eu dizia, quando os salteadores e proscritos criarem coragem para empurrar aquelas portas, encontrarão tesouros incríveis e cajados chamadores de raios, além de pelo menos uns cinco satélites muito entediados e enfurecidos...

A terceira foi Bethlehem, um grande castelo com três grandes planos para artilharia, sob Avelt, o Brilhor Noturno. Lá se faziam lâmpadas incandescentes, como as longinianas, mas com centelhas loucas que dançavam em tons de laranja e púrpura. Tinham até um grande farol de batalha cuja luz nunca foi acesa. É dito que seu lampejo poderia cegar um homem para sempre. Suas barricadas também eram as maiores. Se Iblis chegasse lá ele ia ver o que chamamos "resistência secular".

A última foi Impatiens, sob Cebalrai, Dominador dos Véus, a "Morada dos Invencíveis", uma fortaleza localmente famosa pelos seus caçadores de avantesma, aparentemente imortais graças às armas encantadas com o Bracelete da Concha Mística que transformava ferimentos em simples cansaço. Era um espetáculo tão certo vê-los lutar que lembro de cortejos os seguindo, com faixas e bandeirolas. Derrubavam avantesmas no mar, avantesmas costeiros, subjugavam satélites rebelados com grandes alabardas e bestas que disparavam munição mística.

Era bom... bons tempos... glória, capitalismo... adeus, Rublo! Pra mim chega.

Artigo: Da Construção de Nova Eiselc

Contou-me um escrivão do Palácio Oceânico que em seus tempos de juventude, Meredith tinha seis cadernos de capa preta e espiral, de folhas largas e grossas, onde desenhava seus sonhos e devaneios. Eles foram selados por ele mesmo em uma arca, pedindo que Else abrisse-lhes passando-se um número de anos após sua morte. Isso aconteceu alguns anos antes que desaparecesse, mas depois da morte de Pluma Isabelle.

Imagino que poucos saibam se e qual evidência a Hierofante teve da morte de Meredith: fato é que há alguns anos a arca foi violada por ela, que tomou os cadernos. E Nova Eiselc talvez fosse a primeira das páginas: um distrito aéreo, suspenso por grades de ferro e acima das nuvens, o lugar mais frio do mundo. O sonho de Meredith virou realidade há alguns meses atrás com a construção do Primeiro Distrito Aéreo e da linha de bonde que pode levar as pessoas para lá.

Tenho certeza que o pragmatismo de Else não a permitiu construir aquela primeira página apenas para realizar um desejo póstumo do imperador caído. Mas a intenção da Quimera por trás daquelas barras de metal é a que eu daria meu mundo para descobrir.

Leitura: O Grande Anfiteatro Real "Vislada"

Sua fundação data de 404 D.F., e sua construção foi feita com o apoio de aristocratas cedarianos como um símbolo da amizade e dos acordos vitalícios de comércio entre os dois países. A Vislada já foi palco de muitas apresentações e eventos históricos, como a declaração de guerra de 701 D.F. e a última apresentação da banda que veio a se tornar o maior fenômeno musical do século entre os jovens, a Pedras Esmagadoras (na ocasião, segundo testemunhas, houve quem tivesse invadido o anfiteatro pelo telhado e tivesse assistido a apresentação pendurado no lustre).

Hoje em dia, a Vislada recupera-se do fechamento e posterior depredação causados pela política de guerra mereditiana, em sua maior parte com investimento de particulares, como o digníssimo sr. Gen. Firdaus Durante, distinto gênio da balística e criador de muitas armas e orbes que levaram Odenheim a uma vitória com menos fatalidades nas guerras de fronteira. Com a freqüência aproximada de quinze dias, atores e atrizes trabalham de graça produzindo espetáculos patrocinados pela casa, somente para angariar fundos para sua restauração. Estima-se que somente o conserto dos três grandes lustres de cristal requeira um trabalho de muitos especialistas, avaliado em, pelo menos, duzentas e cinqüenta mil rúpias.

Infelizmente, enquanto um pequeno movimento da Quimera poderia devolver à Vislada a glória de dias antigos, esta parece ignorar o teatro que moveu tantos corações em tempos passados.

Transcrição do Tomo dos Regentes, III


Trouxe
Do inominado nada - que não era nada
Os olhos que lhe serviriam
E neles fez brilhar uma luz que seguiriam
Como mariposas ao fogo
(portanto já Eram as mariposas)


Artigo: O Santuário de Asperi

Ao sul do grande planalto que circunda Lodis, guardado por névoas permanentes em sua condição de baixio, o pequeno Bosque Gris guarda uma antiga igreja, o Templo Sagrado de Asperi, o já caído Altíssimo do pó e das cinzas. Esta igreja de estilo chanteliano antigo, depois de anos de abandono e chuvas e depois de todas as linhagens de oradores de Asperi terem se esvaído, tornou-se uma figura melancólica, quase desaparecida no bosque. Até este ponto, o Templo Sagrado de Asperi teve o mesmo destino de tantos outros templos de estrelas apagadas, como Calícrates e tantos outros longinianos. Suas torres compridas e negras por lá ficaram por, talvez, um século, e teriam sido esquecidas e dominadas pela vegetação.

As disputas pela coroa odeniana, porém, fizeram com que o lugar tornasse-se uma espécie de refúgio de cavaleiros bandidos, primeiramente Ld. Marin Karkaroff e seus asseclas, e, ao que tudo indica, hoje em dia, a resistência do que sobrou da Ordem Pristina liderada por Ld. Gunther Quirian, Senhor dos Mares.

Já houveram várias ordens para que demolissem a pequena igreja nos intervalos entre essas ocupações - foi erguido, inclusive, um pequeno santuário em honra do Altíssimo Asperi em Lodis, capital. Entretanto, todas as tentativas de encontrar o templo destas vezes falharam, e uma resultou em uma pequena chacina promovida por, segundo testemunhas, cálciferes enlouquecidos. Uma espécie de vontade superior parece proteger o local, permitindo que entre somente quem não tiver intenções que vão de encontro à permanência do pequeno templo. Diz-se que a Quimera cogitou bombardear o lugar, mas a ordem foi retirada de maneira abrupta e suspeita por um alto oficial odeniano. Parece-me que a capital prefere dar aos meliantes um lugar para se esconder, e saber que eles estão ali.

Leitura: A História de Hepzibah, parte 5

A última parte da história de Hepzibah escapou às trovas e parece ser de conhecimento de poucas pessoas apenas, então falo nos poucos detalhes que pude confirmar. O meio-djin repetiu o trajeto de Keshal partindo do norte ocidental de Faris atravessando as terras de contestação e cruzando com muitas caravanas, então aprendendo sobre o que estava acontecendo. Ele não precisava de uma chance, só de um lugar para apertar as espadas contra os pardos, e escolheu Oden para isso. Sabia, também, que era pouco mais que um animal pelo que a maioria das pessoas entendia, um animal perigoso e astuto.

Por isso, Hepzibah decidiu agir exatamente como o animal perigoso e astuto que pensavam que era. E foi um instante até que encontrou um cavaleiro-de-regimento nortista, usando uma bela armadura completa da Armurada e - o que mais importava, um distinto brasão pessoal.

Hepzibah deve ter acabado com ele, ou, no mínimo, o deixado estraçalhado. Mas o meio-djin, sabe-se lá com que palavras, assumiu sua armadura e partiu em um barco que retornava a Oden para a guerra. E nunca mais ouviu falar-se de Aulus, o Irresponsável, que era o nome do pobre-coitado; na verdade nunca mais ouviu falar-se do verdadeiro Aulus o Irresponsável, porque Hepzibah estava construindo uma sólida reputação com seu 'novo estilo' duas-espadas-muitas-mortes.

Qualquer um apostaria que não ia durar muito tempo. Atingido por uma lança, o falso Aulus jorrou fogo do ferimento, entrando em colapso no meio do campo de batalha. Seus companheiros não estavam entendendo o que estava acontecendo - provavelmente acharam que era mais uma invenção da mente maquiavélica ivoreana, lanças abençoadas por Iblis ou carregadas de alquimia, e que o pobre Aulus havia sido vitimado por uma delas.

Qual foi a surpresa deles quando onde deveria haver Aulus houve Hepzibah? Mas o prestígio do pequeno meio-djin entre os soldados era grande e ele acabou ficando nas fileiras dos Elmos Escarlates. "Rachamarfim", como ficou conhecido, o grande derrubador de ivoreanos, grande estoporador de avantesmas, grande, grande. E foi quase engraçado quando começaram a obedecê-lo, e novamente quase engraçado quando começaram a ignorar solenemente o Ld. Fabian Tertius, último comandante de um dos destacamentos lá.

Assim surgiu a ordem dos Rebentos de Rachamarfim.