Leitura: A História de Hepzibah, parte 4

Uma flecha cortou o nada em que se abrigava. Atingiu ao longe a aura que o prendia à terra e ele viu que ainda havia... Seu poder feiticeiro se libertou numa coluna de chamas vermelho-vivo abrasando o chão e tudo, e da certeza da morte ele despertou para a batalha.

O arqueiro vinha com guerreiros que berravam contra os pardos, golpeando com suas espadas em raios de aço e ar que atingiam ao longe. Antes que pudesse tentar se defender deles, pararam de atacar. Não queriam matá-lo. Pegaram os ivoreanos voltando de uma missão, isso sim, e a eles destruíram. Ficaram ao longe fitando-o à distância. Não tocaram os pardos: suas geomancias e flechas o fizeram.

Hepzibah se levantou e tentou falar a eles. Ouviram os dragões um guincho, como uma palavra de ódio, mas os olhos do meio-djin mostravam-se agradecidos. Aproximaram-se com cautela. Um colheu do chão uma pequena lis-de-Ivoire. Não pensariam em nada melhor. O jovem dragão ofereceu a lis a Hepzibah e ele a tomou em mãos trêmulas. Sorriu, se é que sabia sorrir.

Levantou-se de seu limbo e juntou-se aos dragões. Havia um entendimento irracional entre eles, uma aliança inconsciente. O arqueiro chamava-se Fiachra e era o líder de um grupo de dragões-da-República que ficaram ferrados e presos em território ivoreano. Terroristas e assassinos, uma vez uniram-se à XV para explodir uma usina em Hevelius. Hepzibah juntara-se a eles muito depois disso, quase cinco anos depois. Já havia findado a Décima Quinta e tudo que remetia a ela. Era o auge da guerra dos odenianos com os ivoreanos. Os dragões não estavam em lado algum e odiavam as duas partes, os ivoreanos mais do que os odenianos.

Hepzibah permaneceu unido a eles, lutando contra os odiados ivoreanos até que todos estavam mortos, quase dez anos depois. Viveram juntos todos os desfortúnios de quem batalha uma guerra que já havia sido perdida. Fiachra morreu inútil no meio do fogo, suas flechas caladas quando um dia cantavam livres antes de enterrarem-se em sangue pardo. Hepzibah o Improvável (como o chamavam) foi o último dos Dragões de Chumbo de Fiachra, e herdou a disciplina pálida e fria do ódio dos corações humas. Havia aprendido a luta dos homens. Sua força oculta de meio-djin o fazia poder carregar duas espadas quando todos levavam somente uma. E eram grandes espadas - espadas de Dragão. Hepzibah não podia parar de lutar, morreria se o fizesse. Aprendeu o ódio, e não mais viveria em paz sem exercer sua única satisfação. Tinha medo de destruir todos os ivoreanos: não sobraria ninguém para ele ganhar seu dia.

Rumou para Odenheim. Haveriam de aceitar duas espadas contra os pardos. Isso foi em 716 D.F., as fronteiras estavam tomadas, Capela ocupada e as tropas de assalto terrestres avançando duramente para Vercel.

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